26 de abril de 2010

Recuerdos de Ypacaraí


Recuerdos de Ipacaray era a música favorita do meu pai, que ele adorava cantar com os amigos, especialmente na Casa Paraguaia, onde toda a família se reunia nos churrascos de domingo.


Curiosamente a canção, uma das mais conhecidas mundo afora sobre o Paraguai, gravada e regravada por, entre outros, Julio Iglesias, foi composta por uma argentina que só foi pisar as terras guaranis longos anos depois do estrondoso sucesso de sua composição, já na terceira idade.


Dia desses me peguei cantarolando Recuerdos de Ipacaray, que ficou dias e dias me martelando. Justo eu, que nunca tinha atentado para a letra e achava que não tinha nenhuma relação especial com ela.


A tradução me veio espontaneamente, que transcrevo a seguir. Anexo também uma interpretação da cantora Perla.




Recuerdos de Ypacaraí


Zulema de Mirkin e Demetrio Ortiz


Una noche tibia nos conocimos

Junto al lago azul de Ypacaraí

Tú cantabas triste por el camino

Viejas melodías en guaraní.


Y con el embrujo de tus canciones

Iba renaciendo tu amor en mí

Y en la noche hermosa de plenilunio

De tu blanca mano sentí el calor

Que con sus caricias me dio el amor.


Donde estás ahora cuñataí

Que tu suave canto no llega a mí

Donde estás ahora mi ser te añora

Con frenesí.


Todo te recuerda mi dulce amor

Junto al lago azul de Ypacaraí

Donde para siempre mi amor te espera

Cuñataí.


Lembranças de Ipacaraí


Trad. Fábio Aristimunho Vargas


Uma noite fria nos conhecemos

Junto ao lago azul de Ipacaraí

Tu cantavas triste pelo caminho

Velhas melodias em guarani.


E com o encanto de tuas cantigas

Ia renascendo meu amor por ti

E na bela noite de plenilúnio

De tua branca mão eu senti o calor

Que com seus carinhos achei o amor.


Onde estás agora, cunhataí,

Que teu suave canto não chega aqui

Onde estás agora meu ser te implora

Com frenesi.


Tudo faz lembrar-te, meu doce amor,

Junto ao lago azul de Ipacaraí

Onde para sempre meu amor te espera

Cunhataí.



Comentários à tradução:


Cuñataí é menina-moça em guarani. O lago de Ypacaraí fica perto de Assunção e nada tem de azul. Há divergências quanto a algumas passagens do original, especialmente com relação ao penúltimo verso.


A palavra noche aparece duas vezes, ora qualificada como tibia (morna), ora como hermosa (linda). Inicialmente pensei trocar a posição dos adjetivos na tradução (“Uma noite linda nos conhecemos”, “E na noite morna de plenilúnio”), preservando a sonoridade das vogais. No entanto essa solução, ponderei depois, iria contra teor da letra: a noite começa morna e se torna linda conforme o amor toma forma. Alterar essa ordem seria intervir fortemente no texto. Por fim cheguei à solução de qualificar a noite como “fria” no primeiro verso, solução que entendo mais fidedigna e que combina mais com o "triste" da primeira estrofe.


Os versos “De tu blanca mano sentí el calor / Que con sus caricias me dio el amor” podem, numa tradução literal, se mostrar de complexa compreensão para o ouvido brasileiro, acostumado a confundir a 2ª e a 3ª pessoas. Quem deu o calor, tu ou a mão? Para contornar o problema optei por “achei o amor”.


Todo te recuerda não pode ser traduzido como “Tudo te recorda”, que teria mais o sentido de “todas as coisas se lembram de você” e não de “tudo faz lembrar de você”. Optei pelo sintético “Tudo faz lembrar-te”.